terça-feira, 13 de março de 2012

Sorriso de olhos verdes

Por Silvia Badim
Desenho de Ana Vasconcellos




Talvez fosse uma dor que ainda existisse lá dentro, e latejasse sem sentido. 
Em momentos inesperados, sempre, como naqueles em que estamos felizes, beirando a intensidade do muito. 
O muito que em algum lugar ainda se assombrava pela ausência. Talvez ainda me doessem as ausências, e os revesses dos mergulhos nos abismos que culminaram em rochas pontudas e mares revoltos.  

Uma fragilidade me assombrava os olhos. 
Humana, demasiada, fragilidade de se pegar no colo com vontade de choro. Fragilidade de desamparo.
Infantilidade consentida que se escondia na vida adulta de tantos afazeres duros. De amores que não conseguia tocar assim, com as mãos totalmente desarmadas. 
Os dedos ainda sangravam, e eu não sabia como contar das feridas que se escondiam embaixo das unhas sempre coloridas e retocadas de maquiagem. 

As intensidades sempre me foram imãs. Atrações quase fatais, obstinadas pela vontade de se atirar no vermelho que dilacera tudo por dentro. Quase um vício, uma ansiedade, um ferrugem dourado que corrói tudo por dentro. Corrói deixando um lastro de beleza pelas coisas vividas, que um dia hão de se transformar, se possível, em asas de borboletas. Amor e dor, sim, amor e dor. Não sabia mais como desvincular um do outro, como se ambos fossem irmãos de mãos dadas. Duas faces da mesma moeda. 

Canso-me. Eu não quero mais. Não quero mais a dor. Deito-me sem pressa de levantar, com vontades outras de renascer em possibilidades novas. 
Estiro-me na grama e olho o céu, desejando o amor facinho, bonito de dia de sol. Todos os dias estiro-me, um pouco, mentalizando o mesmo desejo. 

Foi quando te vi passando. Lá deitada olhei para cima, e seu sorriso de olhos verdes me olhou com alegria. 
Verde vibrante, embora com desconfianças dilatadas nas pupilas. Verde desejo, verde presença. Verde esperança, verde vontade.
Verdes possibilidades. 
 
"Eu quero", pensei. E penso, a cada dia. 
E eu quero assim, o sorriso e o muito que pode ser leve. As desconfianças enfrentadas, que são passos para se construir um novo lugar. 
Um lugar de abrigos mansos e de felicidades espalhadas. 
Um lugar possível. 

Olho no olho, sem roupas que não nos cabem mais. 
Dança comigo?

Nenhum comentário:

Postar um comentário